De onde mesmo?

Sorriu e se aproximou de mim, simpático. Falou meu nome, tentei a todo custo lembrar o dele, em vão. O rosto não era desconhecido, mas tive que me esforçar para lembrar que tipo de relação tivéramos e de onde o conhecia.

Perguntou coisas que me fizeram recordar que cursamos algumas matérias juntos quando entramos na universidade, embora estudássemos em cursos diferentes. O fio da memória foi puxando as situações do passado: ele me paquerava naquele tempo, mas era todo esquisito e eu não dava a menor bola.

Agora estava diferente, tinha encorpado, estava mais comunicativo, menos tímido, mais altivo. Acho que pela primeira vez reparei nele. Achei o rapaz bem bonito.

Tinha começado a trabalhar numa grande empresa desde que se formou, viajava muito a trabalho. Por acaso, íamos para o mesmo lugar e sentamos lado a lado.

Uso um travesseiro de viagem um tanto quanto ridículo, resultado de uma urgência, que atrai olhares e no início me fazia chamar a atenção mais do que gostava… Hoje em dia já me acostumei e acho até divertido o tanto de gente que puxa assunto, só por causa dele.

Com o rapaz não foi diferente… Logo que embarcamos, tirei da mochila o tal travesseiro. O moço perguntou algo e fez uma piadinha. Justifiquei dizendo que comprara durante uma viagem longa, pois não queria correr o risco de acordar no ombro da pessoa que estava sentada do meu lado: um senhor que insistia em tentar me fazer jogar fora o livro do Jorge Amado e me converter a sua religião, uma dessas numerosas neopentecostais ultraconservadoras (ai, que preguiça!).

Ele riu alto e espontâneo e disse que o tal senhor evangélico seria um baita sortudo se eu me apoiasse nele para dormir. Sorri entre tímida e presunçosa. Passei a gastar todo meu charme, jogando pra cima do rapaz, até que o assunto acabou e ele me propôs não usar o travesseiro naquela viagem, mas seu próprio ombro.

Não fiz cerimônias e encostei-me a ele. Passou o braço em volta da minha cintura, forte, uma pegada M-A-R-A-V-I-L-H-O-S-A, me beijou com uma vontade que parecia guardada há 10 anos.

Nos pegamos a viagem inteira. No desembarque nos despedimos sem trocar telefone ou qualquer outro contato. Ainda não lembro seu nome!

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